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O colonialismo em Kim, de Rudyard Kipling, pelas edições brasileiras sob análise de Amorim


Lauro Maia Amorim publicou em Tradução e adaptação: Encruzilhadas da textualidade em Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, e Kim, de Rudyard Kipling uma reflexão sobre a identidade da tradução e de seus limites, sobre o entrecruzamento e o traduzir e o adaptar. A análise de duas reescrituras para a língua portuguesa revela a complexa relação entre os problemas suscitados pelo colonialismo e a própria dimensão discursiva que permeia os conceitos de tradução e de adaptação, conforme destacado no sexto capítulo da obra.

Kim, de Kipling, um dos maiores escritores ingleses, foi originalmente publicado em 1901 e, nele, conta-se sobre um órfão irlandês que passa por maus bocados na Índia de domínio inglês que, ao ser publicado no Brasil, passou por mudanças como a substituição de expressões idiomáticas como “conto da carocha” por “conto da carochinha” e, na reedição de 2002, adaptadas passagens polêmicas que poderiam ser lidas como erros de tradução.

A maioria das notas explicativas presentes na versão brasileira, entretanto, refere-se a expressões pouco usuais da língua portuguesa e não a termos da cultura indiana, como esperado, uma vez que o texto original traz, ainda, notas sobre eventos históricos e aspectos culturais sobre o imperialismo britânico sob olhar crítico – o que foi deixado de lado pela tradução do nacionalista Monteiro Lobato, criticada por reforçar o ideário da superioridade dos brancos exemplificada em atribuições como "raça inglesa" e “velho semidoido” aos personagens centrais, diminuindo sua importância por uma visão preconceituosa de sua etnia. 

Já na adaptação de Sabino, uma introdução não assinada contextualiza historicamente Kipling e sua obra, indic(i)ando problemas relativos a questões coloniais com discurso de oposição. “A contextualização desenvolvida conduz o leitor a um certo perfil biográfico e literário do autor que, mais adiante, vai servir como ponto de partida para defender uma certa concepção interpretativa de seu trabalho”, para citar Amorim. 

Percebe-se, ainda, que a tradução de Sabino é trabalhada, ainda, como uma adaptação, permitindo-a transgressões, ou seja, justificando possíveis liberdades criativas em relação a sua convergência do texto original ao português, nas quais acrescenta um pouco de sua autoria na obra. Neste sentindo, busca “apresentar um Kipling sem conflitos [...] ao omitir ou abrandar passagens que sugerem o preconceito colonialista”. 

Não se nega, entretanto, que o texto de Lobato, embora tido como uma tradução, e não adaptação, também comete transgressões no sentido de intensificar o ideário de superioridade ocidental apresentada por traços conservadores. 

Comparando as duas traduções, revela-se um confronto entre uma leitura “politicamente correta” e uma “suspeita” que aponta problemas debatidos pelas teorias pós-coloniais ainda nas escolhas de palavras, como no trecho “Kim stood amazed at this, because he had overheart the talk in the Museum, and knew that the old man was speaking the truth, which is a thing a native on the road seldom presentes to a stranger” (Kipling, 1989, p. 64), com destaque a palavra stranger que pode significar tanto “estranho” quanto “desconhecido” ou “estrangeiro”, cada qual detentora de um significado próprio dentro de seu contexto. 

Na tradução de Lobato, opta-se pelo “estrangeiro”, enfatizando a ideia de que Kim não pertence a este lugar e tampouco seria bem-vindo ali, enquanto o “desconhecido” optado por Sabino aponta uma visão “universal” seguida pelo dito popular brasileiro que não devemos conversar com quem não conhecemos – sejam eles nativos ou não. 

Nas últimas páginas do livro de Amorim, coloca-se que “a identidade do tradutor, assim como da própria tradução, é atravessada pelas “encruzilhadas” que fazem de seu trabalho um evento, ao mesmo tempo, singular e plural”, criando uma dimensão na qual encontram-se o texto original e o texto traduzido em um embate linguístico-cultural que permite diversas possibilidades de direcionamento com base no discurso do tradutor/adaptador, função qual definida segundo seu grau de inscrição na elaboração do texto. Para bem ou para mal.

Texto originalmente escrito como resumo da obra de Amorim para estudos avançados em Língua Inglesa com ênfase em tradução.

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